Se não tem, ele pode ser desenvolvido. É fundamental que todos tenham o senso de dono na empresa em que trabalham, caso contrário, provavelmente estão no lugar errado
Nas palavras de Pollyana Guimarães, idealizadora da Evoluzi, empresa de curadoria de treinamentos corporativos, qualquer pessoa pode desenvolver o senso de dono, especialmente no sentido de ter agilidade e rapidez no processo de tomada de decisão. “Isso porque o conceito deixa implícito três critérios que são fundamentais para sua aplicação na prática, que levam em conta como as suas ações impactam a vidas das pessoas, o ambiente de trabalho e como vão trazer resultados positivos de crescimento”.

Por essa razão, diz ela, “é importante deixar claro que o senso de dono é algo que demanda um desenvolvimento contínuo. De nada adianta ter intrínseco o entendimento do que é, se não tem desenvolvidas as competências e habilidades para estar à frente de tais ações. Desta forma, cabe ressaltar a importância da participação das empresas nesse processo, afinal, são as que mais têm a ganhar com essa modalidade de qualificação de líderes”.
Ela acrescenta que investir no treinamento da equipe para desenvolver o senso de dono se aplica a todos os colaboradores, porém, isso precisa estar alinhado à cultura da empresa. “Não adianta dar o treinamento e não ter indicadores para monitorar o comportamento. As lideranças precisam estar muito engajadas nesse propósito”.
Empreendedor serial à frente de negócios em diversos segmentos como indústria, distribuição, varejo, e-commerce e educação, Rica Mello, também afirma que o senso de dono tem que estar presente em todos os colaboradores. “Todos têm que ter os valores da empresa quase que carimbados em suas peles. É assim que você consegue criar culturas empresariais fortes”.
Ainda, de acordo com ele, quando alguém não tem senso de dono ou quando não está colocando em prática os valores das empresas, outros podem ajudá-los e caso ele não mude de comportamento, naturalmente, acaba sendo excluído da empresa. “Isto não é o desejável, mas é bom para não enfraquecer a cultura da empresa”, explica.
Contratação
No momento de contratação alguns indícios já podem ser observados. As dicas de Pollyana são “avaliar como era seu comprometimento com as pessoas e processos nas empresas anteriores. Quantos cursos fez no último ano e como se vê nos próximos 2 anos, nesse caso, para avaliar a ambição e expectativas do candidato”.
Rica sugere alguns questionamentos, como por exemplo, o que ele fez quando precisou resolver determinado problema de um cliente? “Esta pergunta serve para perceber se ele conseguiu resolvê-la do começo, meio e fim, ou seja, se ele tem tratativa, iniciativa e acabativa. Pode também recriar momentos em que se viram atitudes em um departamento que estava desconsoante com os valores da empresa. Perguntar se em algum momento ele trouxe uma redução de custo para a empresa em que trabalhava e qual o valor que ele deu quando trouxe uma economia para a empresa. Perguntas para perceber se a pessoa tem o senso de dono mais enraizado nela ou não”.
Desenvolvimento
Como nem sempre o senso de dono é natural nos colaboradores, ele pode ser desenvolvido, eles dão dicas sobre como identificar em quem vale a pena investir. “Vale a pena investir nos colaboradores com foco no autodesenvolvimento, intraempreendedorismo e que se preocupam com os resultados da empresa, passando pelo comprometimento de redução de despesas”, pontua Pollyana.
“Basicamente, tem pessoas com senso de dono mais apurado e quem não tem, tem que treinar, ensinar quais atitudes precisam ter para que elas consigam desenvolver esse senso. E quando de fato elas não têm senso de dono, não cuidam do cliente, que é a razão de todas as empresas, e se também não cuidam bem dos custos e não têm a característica de união, não vale a pena investir”, afirma Rica.
Segundo ele, há duas maneiras de investir nos colaboradores, no atacado e no varejo. “No atacado é pela cultura da empresa, quando ela tem muito claro os seus valores e a sua missão, o porquê de ela existir e para onde ela está indo. Há uma cultura empresarial forte e todo mundo entende qual é o papel de cada um e para onde está indo. É claro que nesse atacado, você deveria pensar como inspirar, motivar e ter processos para conseguir o reconhecimento de cada um e dar cada vez mais potencial para as pessoas crescerem”.
No varejo, explica Rica, o papel é do gestor. “As pessoas têm capacidades e potenciais diferentes, e quem tem que ver isso é o gestor direto daquela equipe. Ele tem que ter critérios de avaliação e ajudar quem quer ir mais longe em sua carreira, quem tem mais ambição, e tem gente que tem menos, o que não é um problema. É garantir que todos estejam felizes com os papeis que exercem. É sempre o cargo acima olhando para os níveis abaixo e nada impede que olhem para outros níveis para já prepararem pessoas para darem os próximos passos para chegarem mais à frente. Também vemos que núcleos de gestão não olham só o próprio núcleo, mas também o próximo e o próximo”.
Atitudes
De acordo com Pollyana, os principais sinais e atitudes que os colaboradores demonstram que têm ou podem ter o senso de dono, começam pelo comprometimento com pessoas. “Passando pela satisfação do cliente interno e externo. Como diz Simon Sinek (um consultor Inglês), se você não entender de gente, jamais entenderá de negócios. Outro comportamento que pode ser avaliado é o de comprometimento com os gastos da empresa”. O contrário, “é o profissional que fica isolado e não gosta de contato com as pessoas, que faz as suas atividades e pronto, profissional que não gosta de se desenvolver para aprimorar suas habilidades e competências”, especifica.

Rica também destaca o comprometimento com os gastos da empresa. “Quem tem senso de dono está preocupado com os gastos, com os custos, e gastará o que realmente necessita de investimento, para que consiga entregar um produto ou serviço de ótima qualidade para os seus clientes. Ele está preocupado com o cliente, que como eu disse anteriormente, é o bem mais importante de uma empresa. Cuidar dos clientes e dar respostas rápidas para eles, quando têm um problema”, conclui.
Pontos-chave
A seguir, Pollyana pontua quais critérios devem ser aplicados para despertar do senso de dono:
– Desenvolver competências: Aqueles que serão inseridos nesse processo precisam passar por uma capacitação para adquirirem uma visão abrangente do negócio. Esse treinamento é fundamental para ajudá-los a identificar quando algo precisa ser feito e qual o caminho certo a ser seguido.
– Fazer a gestão do tempo: A capacitação ocorre simultaneamente à execução de outras tarefas. Assim, é necessário gerenciar o tempo, de modo que seja conciliado o período de trabalho para dar a devida atenção às demais áreas da empresa.
– Fortalecer a interação social: Se preocupar com as pessoas é a peça-chave no desenvolvimento do senso de dono. Ter essa empatia configura em entender e priorizar processos obrigatórios, como dar feedbacks – que precisam ser vistos como um ato de amor e não como algo já padronizado.
– Estudar o segmento: É crucial entender o mercado de atuação da empresa, bem como saber quem são os concorrentes e quais impactos sociais são causados. Isso ajuda a identificar as competências que precisam ser desenvolvidas para que, de fato, haja uma ação efetiva naquilo que precisa ser feito.
Conhecer os números da empresa. Durante o processo de desenvolvimento e treinamento, o profissional precisa não somente conhecer o faturamento, mas também os números da empresa. Afinal, a partir disso terá o conhecimento pleno acerca das dificuldades e desafios para exercer a gestão empresarial com maior propriedade.
Senso natural de dono
Coordenador de Compras da Jocar, Claudinei da Silva Florêncio, começou no setor automotivo aos 14 anos de idade em uma oficina de vidraçaria, como instalador de fechaduras, maçanetas e borrachas. Na Jocar desde 1987, ele entrou como vendedor de balcão, passou por todas as funções até chegar ao seu cargo atual. Ele conta que o senso de dono é natural dele.

“Para todas as decisões que eu tomo, eu vejo o lado da empresa como um todo. Eu sou o cara que ajuda, puxa a orelha dos outros e faz a coisa acontecer. Sou de Compras, mas às vezes ajudo em outros departamentos, da mesma forma que eu sou”.
Para ele, todos os colaboradores precisam ter o senso de dono. “É importante para todos, pois assim, conseguem ajudar a cortar custos, melhorar o ambiente de trabalho e melhorar em tudo. Porque quando você vê alguma coisa errada, corrige e vê o que pode mudar, é melhor para todo o sistema da empresa”.
Claudinei ensina dando exemplos para a sua equipe. “Às vezes, a pessoa vai comprar um produto e foca no melhor e não no pacote, que é o melhor preço e do fornecedor que lhe dê total segurança. Pagar muito barato não significa que tenha feito o melhor negócio, o barato pode sair caro, se receber o produto que não era o que esperava, e é na garantia que você vê quem é ou não o seu parceiro. Tem que avaliar preço bom e se o fornecedor te dá assistência. Isso eu sempre passo para o pessoal aqui”, conclui.